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Sobre as Águas

Quem compara medalhas do Pan e da Olimpíada não entende nada de esporte

Antonio Alonso

27/07/2015 12h34

Foto: Ricardo Taves/Agência Corinthians

 Felipe França, a "única" medalha olímpica no Pan. (Ãhn???) Foto: Ricardo Taves/Agência Corinthians

Estou contaminado. Contra minha vontade, tornei-me um mau-humorado passivo. Se meu time perde, é porque é um bando de pernas-de-pau. Se meu time ganha, alguém tem um ótimo motivo pra me convencer da mesma coisa: são um bando de pernas-de-pau! É inapelável.

Desde o primeiro dia de Pan-Americano eu acompanho a mesma coisa: medalha de Pan não vale nada; na Olimpíada esse cara não teria chance, o nível é muito baixo… Ora, eu me pergunto: Como esse pessoal conseguiu calcular as medalhas na Vela? E nas lutas? A cereja do bolo veio depois das provas da natação. "Vitoriosa no Pan, natação ganharia apenas uma medalha olímpica". Afinal, parece uma tarefa fácil: é só comparar os tempos, né? Né não, campeão.

A comparação na natação é provavelmente a maior prova de que esse mau-humor está a serviço da mediocridade. Existe uma coisa chamada "periodização". Nos esportes individuais, a periodização é o mapa da mina. Nenhum nadador faz tempo de final olímpica o ano todo, os atletas chegam nesses tempos depois de uma fase de "descanso" específico, chamada polimento. Se você erra essa periodização e seus melhores tempos chegam antes da hora, você errou o mapa da mina. O Mundial de natação começa em menos de uma semana. Ou seja, não era mesmo pra ninguém estar "voando" nesse Pan. Nossa "única medalha" na natação pode significar duas coisas: ou o Felipe França vai detonar no Mundial (o que eu acho provável); ou ele errou a periodização. Isso nem é tão complicado de saber, qualquer criança que nadou Jogos Regionais sabe.

O Campeonato Mundial de Natação começa em menos de uma semana. Ou seja, se eu estiver errado vai ser fácil de me desmascarar.

Além do erro "técnico" nessa comparação, tem o erro conceitual. Existe neste mundo outra coisa, muito valiosa e pouco valorizada, chamada "cultura esportiva". É importante levar para o Pan gente que nunca vai ganhar medalha olímpica? Eu acho que sim, como é importante ter que nunca será campeão mundial velejando no seu clube todo fim de semana. O fim último do esporte pra nossa civilização não é ganhar medalha olímpica. Alguém tem ideia de qual seria? Eu tenho a impressão de que velejadores leitores desse blog têm algumas respostas para essa pergunta.

Estou devendo uma avaliação dos nossos atletas do Pan, prometo voltar com esse assunto.

Sobre o Autor

Antonio Alonso Jr é capitão amador e cobre esporte há 15 anos, com passagens pela Folha de S.Paulo e por um UOL ainda em seus primeiros anos de vida. Jornalista e formado também em Esporte teve a excêntrica ideia de se dedicar à cobertura náutica, com enfoque para a Vela. Depois de oito anos na principal revista especializada do país, estreia seu blog em novo endereço no UOL.

Sobre o Blog

A vela é o exemplo claro de que o sucesso de um esporte não se mede em medalhas. Ela foi o esporte que mais medalhas Olímpicas deu ao Brasil. Ainda assim, é um esporte desconhecido, com enorme dificuldade de atrair público e restrito a guetos idílicos. Este blog não está interessado em resolver esse problema, mas em trazer mais para perto esse esporte excêntrico, complicado talvez, mas cheio de matizes empolgantes e que coloca atletas e meio-ambiente numa simbiose singular no mundo esportivo. Bem-vindo a bordo.

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